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Música Contemporânea com a Associação Arte No Tempo

 

Na última segunda-feira (9 de janeiro de 2023), os alunos de várias turmas do secundário do nosso agrupamento, tiveram a oportunidade de usufruir de uma audição comentada de Música Contemporânea. Decorreu na  Igreja do Convento de S. João Evangelista (Carmelitas) em duas sessões e com músicos do agrupamento ars ad hoc. A programação foi da responsabilidade de Diana Ferreira da associação cultural Arte No Tempo e decorreu no contexto da implementação do Plano Nacional das Artes no nosso agrupamento.

Ricardo Carvalho (flauta transversal), Horácio Ferreira (clarinete) e Gonçalo Lélis (violoncelo) executaram quatro obras, demonstrando e explicando as técnicas necessárias em cada uma delas. A maioria dos alunos mostrou-se surpreendida com a exigência e complexidade necessárias para a sua interpretação. Tratou-se de uma oportunidade única de confrontar os nossos alunos com música diferente daquela a que estão habituados, alargando os seus horizontes no que diz respeito à sua cultura musical e artística.

As obras escutadas foram:
Circumambulation (1993), para flauta solo; de Yan Maresz (Mónaco, 1966).
- Divertimento (1987), para clarinete solo; de Clotilde Rosa (1930 - 2017).
- Trains (2014), para violoncelo e eletrónica; de Joanna Bailie (Londres, 1973).
- Grid (2021), para flauta, clarinete e violoncelo; de Inés Badalo (1989).


Sobre as obras


Yan Maresz (Mónaco, 1966) | Circumambulation [1993]
Estreia: Manuel Zurria; 16. Janeiro. 1998; Istituto Svizzero, Festival Emergenze (Roma)
Esboçada em 1993 no espírito dum estudo compreendendo um “problema de escrita a resolver” (no sentido matemático), esta curta peça joga com a percepção do tipo polifónico dum instrumento monofónico. Uma das respostas possíveis a este problema é de natureza polirrítmica e acabei por justapor dois materiais musicais constrastantes, mas complementares, que tentei conciliar num discurso contínuo: um tratamento percussivo da flauta limitado (com pulsação regular, quase metronómico) e uma escrita melódica mais tradicional em que o espaço para a sua colocação natural é limitado pela sua coexistência com “o outro”. A partir da tensão criada por esta dualidade surge gradualmente uma sensação inesperada, de natureza encantatória, acentuada pela pulsação lancinante que confere à peça um tom ritualista. As principais dificuldades de execução da obra encontram na na manutenção de um tempo estável (que não deve sofrer flutuações), na precisão da articulação rítmica em geral e na atenção particular que exige a cada instante na diferenciação do timbre das duas vozes.
Y. M.


Clotilde Rosa (1930 - 2017) | Divertimento [1987]
Escrita para António Saiote (na altura, membro do Grupo de Música Contemporânea de Lisboa)
“Nesta peça expressei-me num universo do total dos meios tons, numa linguagem pantonal e utilizei processos compositivos para-seriais. A obra parte de vários materiais, marcadamente melódicos e outros rítmicos, proliferando o material através de um jogo de interpolações motívicas. Procurei também explorar, por outro lado, os recursos virtuosísticos e as várias possibilidades tímicas, nomeadamente os multifónicos, vindo estes, a adquirir uma importância estrutural. A notação, livre, sem compasso, tanto proporcional como gráfica, reflexo necessário do discurso. A escrita dos multifónicos foi revista em 2008, por Nuno Pinto.”
C. R.


Joanna Bailie (Londres, 1973) | Trains [2014]
Escrita para e estreada por Francesco Dillon; 2014; Villa Romana (Florença)
Qual o significado de eu usar o formato de áudio de melhor qualidade no meu equipamento (96 kHz/24 bits) para gravar os sons que formam a base de Trains [2014] para violoncelo e electrónica sobre suporte fixo? Maiores frequências de amostragem tornam-se naturalmente úteis quando diminuímos a velocidade (com a equivalente descida na altura do som) e, na verdade, as sete gravações de comboios formam uma escala ascendente, com o primeiro comboio transposto onze meios-tons abaixo e o último tocado na frequência real. Talvez possamos olhar esta escala menor de transposições como uma jogada entre uma realidade alterada, aumentada, e algo mais próximo do modo como as coisas são. Certamente, as transposições maiores do início (porque foram originalmente gravadas a 96 kHz) trazem alguns ultra-sons para a gama da audição humana. Pergunto-me também o que significa ouvir ultra-sons transpostos – fundamentalmente, modificamos os sons transpondo-os e aquilo com que ficamos é uma distorção do que o ultra-som deverá mesmo ser (para os nossos cães e gatos). Trains resulta de uma encomenda do violoncelista Francesco Dillon.


J. B.Inés Badalo (1989) | Grid [2021]
Estreia: ars ad hoc; 7. Novembro. 2021; Serralves (Porto)
“I came from a family of repairers. The spider is a repairer. If you bash into the web of a spider, she doesn't get mad. She weaves and repairs it.” Louise Bourgeois Grid surge de uma encomenda da Arte no Tempo por ocasião da exposição da obra de Louise Bourgeois na Fundação de Serralves. Dada a relação da obra de Bourgeois com o mundo dos aracnídeos, Grid inspira-se na teia de aranha, criando um contexto de diálogo com a exposição. O material sonoro surge como “fios", linhas sonoras ténues e frágeis que se entrelaçam, tecendo uma rede onde os três instrumentos (flauta, clarinete e violoncelo) criam uma textura cada vez mais complexa e densa, cheia de relevos e sonoridades contrastantes, lembrando a teia de aranha como armadilha alimentar para captura de insectos, com sons mais agudos e agressivos, em oposição à fragilidade inicial. A última secção é a antítese do anterior, é o ritmo constante e contínuo, o pulso, o tique-taque de um relógio, a quietude, a constância e a persistência da aranha para reparar sua teia quando ela é danificada, seu espaço de abrigo, sua resistência interna.
I. B.


Sobre a associação cultural Arte No Tempo


A Arte No Tempo é uma estrutura apoiada pela Direcção Geral das Artes, a Arte no Tempo é uma associação cultural sem fins lucrativos que tem como objectivo a divulgação da arte musical contemporânea através da promoção de eventos, do incentivo à criação e à interpretação, da edição e da realização  de  actividades  performativas,  podendo,  para  tal, estabelecer relações com outras formas de expressão artística. Da sua actividade actual, destacam-se os projectos de criação e de divulgação, como as bienais alternadas Reencontros de Música Contemporânea e Aveiro_Síntese, que realiza no Teatro Aveirense, ou o agrupamento de música de câmara ars ad hoc, com as suas residências regulares na Fundação de Serralves, onde apresenta programas de música actual com os mais elevados padrões de exigência, e concertos um pouco por todo o país e no estrangeiro, onde combina a interpretação de música contemporânea com obras incontornáveis do grande repertório. Salienta-se também a criação regular de projectos cénicos e de projectos comunitários (o último dos quais foi o Coro dos Pequenos Cidadãos, apoiado pelo programa Cidadãos Ativ@s), a realização de actividades de formação de músicos (como o Nova Música para Novos Músicos, que se traduz na realização de oficinas em escolas do ensino artístico especializado de música, um estágio de música de conjunto associado às bienais da Arte no Tempo e, ainda, a encomenda e publicação de partituras de novas peças destinadas a músicos em formação; ou o Festival Itinerante de Percussão), a manutenção de actividades de mediação e desenvolvimento de públicos (como as sessões de escuta partilhada Que música ouvimos?, maioritariamente destinadas a um público adulto, e as actividades desenvolvidas em contexto escolar crescer com a música) e a curadoria de concertos de música de câmara com a mais recente criação musical, associada a actividades de formação, de que são exemplo os Tubos de Ensaio, a que se soma ainda a linha de itinerância estrada fora. O mais recente projecto da Arte no Tempo em parceria é o podcast Vortex Temporum.


Sobre o agrupamento ars ad hoc

O ars ad hoc foi criado no contexto da Arte no Tempo como resposta à vontade de fazer música de câmara com os mais elevados padrões de exigência, combinando obras do grande repertório com a mais recente criação musical. O primeiro concerto decorreu no Outono de 2018, numa temporada apoiada pela Direcção Geral das Artes e o Município de Aveiro, em que pôs em confronto música de grandes clássicos com o trabalho de um dos mais interessantes criadores do nosso tempo, o compositor suíço austríaco Beat Furrer (Schaffhausen, 1954), que, em Março de 2019, marcou presença na segunda edição da bienal Reencontros de Música Contemporânea, trabalhando com o ars ad hoc a estreia nacional do seu quinteto intorno al bianco [2016].
Na atribulada temporada de 2019/20, o ars ad hoc prestou particular atenção à música de Ludwig van Beethoven (1770-1827) e de
Luís Antunes Pena (1973), tendo ainda revisitado obras de Beat Furrer e interpretado obras tão extraordinárias como Talea [1982], de Gerard Grisey (1946-1998). Além da sua “temporada regular”, o ars ad hoc marcou ainda presença em alguns festivais, estreando obras encomendadas a compositores portugueses e estrangeiros.
Ainda condicionada pela pandemia de COVID-19, a temporada de 2020/21 trouxe algumas estreias nacionais e absolutas, tendo o ano de 2021 ficado positivamente marcado pelo início da colaboração do agrupamento com a Fundação de Serralves, onde passa a desenvolver as suas residências artísticas, encontrando o ambiente adequado ao desenvolvimento de um trabalho sério de preparação e de apresentação do que tem vindo a desenvolver especificamente no campo da música dos nossos dias – trabalho esse que, de forma mais isolada, apenas vinha a apresentar nas bienais que a Arte no Tempo realiza no Teatro Aveirense. Outras colaborações, trazem a público um ars ad hoc com um campo de acção mais abrangente e versátil, combinando a mais recente criação musical com obras incontornáveis do grande repertório clássico e romântico. Em 2021/22, o ars ad hoc dedicou especial atenção à música de
Simon Steen-Andersen (1976), não deixando de fazer estreias absolutas de compositores portugueses e estreias nacionais de compositores como Beat Furrer, Joanna Bailie e Clara Iannotta. Com especial enfoque na música de Helmut Lachnemann (1935), a temporada de 2022/23 conta com mais estreias de compositores portugueses e com a passagem do agrupamento por diferentes festivais. A possibilidade de desenvolver um trabalho regular na Fundação de Serralves com programas próprios e outros paralelos às exposições, em colaboração com o Serviço de Artes Performativas, foi um importante contributo para redesenhar a estratégia com que pretendemos abraçar o futuro, continuando a levar a grande música a diferentes palcos e a públicos diversos, dando a conhecer o que de melhor se cria nos nossos dias e impulsionando a criação de nova música, em especial junto de compositores mais novos. Apesar de ter já realizado perto de uma dezena de estreias absolutas e mais de uma dúzia de estreias nacionais, o ars ad hoc pretende afirmar-se pela qualidade do trabalho que desenvolve, privilegiando a profundidade das suas interpretações em detrimento do número de obras ou compositores tocados, procurando, sempre que possível, desenvolver uma relação de proximidade com os compositores na exploração das obras. Com programação de Diana Ferreira, o ars ad hoc é formado por músicos que, depois de se terem notabilizado em Portugal, complementaram os seus estudos no estrangeiro, como o flautista Ricardo Carvalho (Aveiro, 1999), o clarinetista Horácio Ferreira (Pinheiro de Ázere, 1988), o pianista João Casimiro de Almeida (Cabeceiras de Basto, 1994), os violinistas Álvaro Pereira (Guimarães, 1986) e Diogo Coelho (Porto, 1988), os violetistas Ricardo Gaspar (Lisboa, 1991) e Francisco Lourenço (Lisboa, 1997) e o violoncelista Gonçalo Lélis (Aveiro, 1995).

Locais onde se apresentou:

- Academia das Ciências de Lisboa
- Auditório de Serralves (Porto)
- Casa da Cultura (Paredes)
- Cine-Teatro Avenida (Castelo Branco)
- Conservatório de Música de Viseu Dr José Azeredo Perdigão (Viseu)
- Convento de Jesus (Setúbal)
- Convento São Francisco (Coimbra)
- GrETUA (Aveiro)
- Igreja das Carmelitas (Aveiro)
- Igreja da Vitória (Vila do Porto)
- Igreja Matriz de Santa Catarina (Calheta)
- Litteraturhuset (Oslo)
- Museu de Aveiro / Santa Joana
- Museu dos Baleeiros (Lajes do Pico)
- Museu Francisco Tavares Proença
 Junior (Castelo Branco)
- Teatro Aveirense (Aveiro)
- Teatro Faialense (Horta)
- Teatro Garcia de Resende (Évora)
- Teatro Micaelense (S. Miguel)
- Teatro Municipal do Campo Alegre (Porto)
- Teatro Municipal da Guarda
- Teatro da Vista Alegre (Ílhavo)

Compositores interpretados:

- Badalo, Inés (1989)
- Bailie, Joanna (1973)
- Baltakas, Vykintas (1972)
- Beethoven, Ludwig van (1770 - 1827)
- Boulanger, Nadia (1887 - 1979)
- Brahms, Johannes (1833 - 1897)
- Caires, Carlos (1968)
- Čiurlionis, Mikalojus K. (1875-1911)
- Debussy, Claude (1862 - 1918)

- Farrenc, Louise (1804 - 1875)
- Feldman, Morton (1926 - 1987)
- Furrer, Beat (1954)
- Grisey, Gérard (1946 - 1998)
- Haydn, Joseph (1732 - 1809)
- Holmboe, Vagn (1909 - 1996)
- Iannotta, Clara (1983)
- Kurtág, György (1926)
- Lamb, Catherine (1982)
- LeBaron, Anne (1953)
- Moreira, João (2004)
- Neto da Costa, Luís (1993)
- Oliveira, João Pedro (1959)
- Pena, Luís Antunes (1973)
- Pinto, João Carlos (1998)
- Repečkaitė, Justina (1989)
- Ribeiro, Ricardo (1971)
- Schubert, Franz (1797 - 1828)
- Schumann, Clara (1819 - 1896)
- Steen-Andersen, Simon (1976)
- Terranova, Daniela (1977)
- Tjøgersen, Kristine (1982)



 








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